O grupo formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, agora ampliado com países como Egito, Etiópia, Irã e Emirados Árabes Unidos, está avançando rapidamente na implementação do BRICS Pay, um sistema de liquidação financeira que promete reduzir a dependência do dólar nas transações comerciais internas. A plataforma, que ganhou o apelido de “Pix Global”, permitirá pagamentos instantâneos entre os países-membros, com custos menores e maior segurança.
Diferentemente de uma moeda única, o BRICS Pay funcionará como uma infraestrutura para transferências internacionais baseada em tecnologias modernas, como blockchain, QR codes, carteiras digitais e canais de comunicação direta entre bancos centrais. O projeto foi destaque na 16ª Cúpula do bloco, realizada em outubro de 2024, na Rússia, e faz parte da estratégia de integração econômica e fortalecimento da autonomia financeira. O ponto mais sensível, no entanto, é que as operações poderão ocorrer sem a intermediação do dólar, o que preocupa os Estados Unidos.
A Casa Branca já manifestou resistência ao plano. O presidente Donald Trump classificou o BRICS como um grupo hostil aos interesses norte-americanos e ameaçou impor tarifas de 10% sobre importações de países alinhados ao bloco. Além disso, os Estados Unidos aumentaram para 50% as tarifas sobre produtos brasileiros e abriram uma investigação contra o Pix, alegando práticas discriminatórias contra empresas norte-americanas. Para analistas, essa tensão é mais um capítulo da disputa geopolítica entre potências emergentes e Washington, que vê no enfraquecimento do dólar uma ameaça à sua supremacia global.
O funcionamento do BRICS Pay será viabilizado pelo Decentralized Cross-border Messaging System (DCMS), desenvolvido pela Universidade Estatal de São Petersburgo. Diferentemente do SWIFT, que é controlado por bancos ocidentais, o DCMS não tem uma autoridade central e permite que cada país administre seu próprio nó. A tecnologia é capaz de processar até 20 mil mensagens por segundo, utiliza protocolos robustos de criptografia e será disponibilizada em código aberto após os testes, sem a cobrança de tarifas obrigatórias. Além disso, a rede foi projetada para operar mesmo quando não houver conexão direta entre os usuários.
A escolha por uma arquitetura baseada em blockchain reforça a intenção do BRICS de criar um sistema mais resistente a sanções e interferências externas. Rússia e China lideram as etapas iniciais do projeto, realizando transações bilaterais em moedas locais. Para o Brasil, a adesão à plataforma é vista como uma oportunidade estratégica para ampliar exportações, especialmente nos setores de agronegócio, energia e mineração. A possibilidade de negociar diretamente em yuan ou rúpias deve reduzir custos cambiais e aumentar a competitividade das empresas brasileiras.
A viabilidade do sistema, no entanto, depende da integração com as plataformas de pagamentos instantâneos já existentes nos países do bloco. A proposta é conectar o Pix brasileiro ao SBP russo, ao UPI indiano, ao IBPS chinês e ao PayShap sul-africano. Especialistas consideram a interoperabilidade um desafio técnico, mas acreditam que a digitalização das moedas nacionais, como o Drex no Brasil, pode acelerar essa adaptação.
Estudos indicam que, até 2030, o BRICS Pay poderá movimentar centenas de bilhões de dólares por ano, consolidando-se como uma alternativa ao SWIFT. A iniciativa também fortalece o papel do Novo Banco de Desenvolvimento (NBD), que deve criar mecanismos de garantia multilateral para reduzir riscos nas operações financeiras. Para os países do bloco, o projeto representa não apenas um avanço tecnológico, mas um passo decisivo para a construção de um sistema financeiro global mais equilibrado e menos dependente das estruturas ocidentais.